domingo, 18 de junho de 2017

UTSM - Ultra-Trail de São Mamede 2017

O que correu mal? Não sei, neste momento ainda não consegui perceber, mas sei que se aos 10 e aos 12k, quando tive de fazer paragens forçadas, fiquei na expectativa, aos 21 em Alegrete tive a certeza que nada ia ser como tinha planeado. 

Foram meses e meses a treinar, a planear, a imaginar como tudo ia ser. Era a minha estreia em provas de 3 dígitos, uma ida ao desconhecido, mas se fisicamente poderia eventualmente não estar bem preparado, psicologicamente sentia-me forte e decidido a terminar. Nos últimos dias andava mais ansioso, mas acho que era normal. Ansioso e nervoso, que nunca mais chegava o grande dia!!

Na semana que antecedeu a prova fui preparando com calma todo o material que ia levar: mochila com tudo que era preciso, frontal, géis, um shot de cafeína para tomar a meio da noite, saco para deixar no Marvão com muda de roupa e ténis e saco para deixar no secretariado com roupa para tomar banho no final. Não houve grandes treinos, toda a preparação estava feita com maioria dos treinos feitos entre a serra e o reforço muscular no ginásio.

Chegado o grande dia, descansei bastante, almocei bem, acabei de rever as coisas e fui ter com o Cláudio e o Sérgio ao Barreiro para seguirmos juntos. Um ligeiro atraso deles começou a deixar-me ansioso, mas depois de arrancarmos e chegarmos a Portalegre com tempo fiquei calmo.

O levantamento dos dorsais foi super rápido, e depois fomos até à pista tirar umas fotos. 



Depois fomos ao carro, preparar as coisas, colocar os dorsais nas mochilas e seguimos para o restaurante lá perto, onde comemos bastante bem.

Jantámos relaxados, e depois ainda antes de ir equipar fomos dar uma volta pela feira do Trail, onde havia o estrondoso número de UM stand de vendas!!!
Voltámos ao carro para equipar, sem pressas que tínhamos bastante tempo, e pelas 23:20 começámo-nos a dirigir para a zona de partida. A azáfama já era grande, e notava-se o pessoal ansioso para que chegasse a hora de partir. Foi-se cumprimentando pessoal conhecido e lá nos posicionámos na caixa de partida, onde ficámos a aguardar enquanto se faziam uns vídeos e tiravam umas fotos!!


Às 00:00, depois de uma pequena contagem decrescente e ao som dos Gritos Mudos dos Xutos e Pontapés, deu-se a tão aguardada partida!! O muito público que assistia ladeava os atletas, aplaudia e incentivava à medida que passávamos. Ambiente BRUTAL!


Segui a um ritmo calmo, sem grandes pressas. Ia entusiasmado, o ambiente era de festa com imensas pessoas ao longo do caminho a apoiar, e foi num instante que se chegou ao 1º abastecimento, aos 8 km. Neste abastecimento o ambiente era espectacular, com muita muita gente! Peguei em 2 pedaços de banana, comi e segui. 

Poucos metros depois do abastecimento entrámos num trilho ligeiramente a subir, ladeado por uns muros baixos, e foi aí que comecei a sentir a barriga a doer. Ainda tive esperança que fosse passageiro e não demorasse a passar, mas em vez disso aumentava. A luz do frontal andava de um lado para o outro, à procura de um local onde fosse seguro fazer uma paragem técnica! Encontrado um lugar que me pareceu seguro, parei e fiz o que tinha de ser feito. No trilho, mais abaixo, via os frontais dos atletas a passar em fila, até que deixei de ver mais luzes alem da minha, quer para trás, quer para a frente… Quando voltei ao trilho estava sozinho! Sensação de liberdade à 1 da manhã completamente sozinho no meio da serra, ouvindo apenas os meus passos e o som dos pássaros! Voltei a correr e consegui apanhar a cauda do grupo que ia a frente, até que por volta do k12 tive de fazer nova paragem….
Antes de voltar ao trilho tomei um Imodium, se havia alguma coisa que poderia ajudar seria isso…
Voltei a correr, já não tao solto como antes, e lentamente fui avançando e transpondo as dificuldades que a organização este ano reservou para os atletas na 1ª parte da prova, nos outros anos considerada bastante rolante
Cerca das 3:30 da manhã, já com um atraso enorme em relação ao que tinha planeado, cheguei finalmente a Alegrete, local do 2º abastecimento.


Sem muita fome, mas com a consciência que tinha de comer alguma coisa, peguei num bolo e num pedaço de banana e num pouco de Coca-Cola, e fui-me sentar a comer. Conforme comi e bebi, deitei tudo fora… Mal acabo de beber a cola vomitei logo. Passou-me logo ai pela cabeça desistir, mas não ia deitar a toalha ao chão tao facilmente. Levantei-me e fui buscar um café. Voltei a sentar e bebi o café calmamente. Já passava das 4 da manha quando me decidi a levantar e seguir. Mas era claramente um dia Não. Assim que estou a sair de Alegrete, ligo o frontal e começa a dar sinal de bateria fraca. WTF??? JÁ???? Supostamente a bateria devia aguentar a noite toda, ainda mais quando andei em modo poupança em zonas com luz… Siga, troquei a bateria por pilhas e segui. Com isto tudo arrefeci e custava a correr. Segui com uma passada rápida, alternando ocasionalmente com corrida. Seguia sozinho, e o foco era chegar o mais rápido possível às antenas, local de abastecimento aos 31k. Entretanto começava a clarear, e com o nascer do dia parecia voltar a vontade e a força para correr.


Eram 6 da manhã, nunca nos piores pesadelos imaginei chegar aos 31k tão tarde, quando cheguei ao abastecimento. Comer muito não arrisquei, em vez disso continuei com banana e bolos, bebendo coca-cola e isotónico. Depois de descansar um pouco lá segui.

E aqui, já com o frontal arrumado e o sol a subir, voltei a correr. Foi o segmento da prova que corri mais, deste abastecimento até S. Julião. 


O terreno também ajudava, maioritariamente a descer, disparei por ali abaixo e passei imensos atletas.  Apenas abrandei para atender o telefone, quando a Bela e os miúdos me ligaram para falar comigo e saber como estava. Que bem que soube este telefonema…
Rapidamente cheguei ao abastecimento de S. Julião. Assim que lá chego recebo um telefonema do meu pai, a dizer que estava no Marvão. Digo-lhe que estou atrasado em relação ao que tinha estimado, e para ir ter comigo a Porto da Espada.
Saio do abastecimento e sigo, decidido a recuperar algum tempo que tinha perdido. Por volta do k45 apanhamos 2 autenticas paredes brutais, onde a ascensão é bastante lenta. Com o sol a bater em cima, é necessário parar diversas vezes, mas nem isso deita o animo abaixo. Assim que chego la acima, em solo espanhol, volto a correr com o foco bem definido: chegar rapidamente ao abastecimento.
Devia ser por volta das 10.30 quando cheguei, não sei bem que horas eram… ver lá o meu Pai e a Lena deu ânimo, e o cheio a bifanas acabadinhas de fazer ajudou!! 
Agarrei-me a uma, se calhar com demasiada pressa! A juntar à bifana foi um pouco de Coca-cola fresca, que soube muito bem mas não deve ter feito muito bem. Comecei  sentir o estômago pesado, sentei-me e voltei a vomitar..
A preocupação instalou-se, equipa de bombeiros veio ver o que se passava. Glicemia estava OK, mas a tensão baixa. Diarreia, vómitos e tensão baixa são sintomas de desidratação. Aconselham a ficar por ali; o meu pai também… ligo para casa, tinha de ouvir a Bela e os miúdos, eles iam ajudar a tomar a melhor decisão. De lágrimas nos olhos, depois de muito pensar, comunico a decisão: vou ficar por ali…

Voltei para Portalegre, almocei e fiquei bem. Depois jantei, e nos dias seguintes também, e não voltei a ter problemas de estômago. Dizem que provavelmente foi ansiedade, nervos, não sei… mas foram muitos meses a treinar para estar bem nesta prova, muitos noites a adormecer a pensar como tudo ia acontecer. Terá sido? É capaz, é algo que tenho de perceber e evitar que volte a acontecer…

Quanto à prova, do que fiz, adorei. O ambiente na arena era brutal, o apoio nos primeiros km idem. Os abastecimentos tinham tudo que poderíamos querer, e as marcações estavam impecáveis, de um ponto viam-se meia dúzia de reflectores, espectacular.

Tenho imensa pensa de não ter terminado, mas analisando agora a frio sei que tomei a melhor opção. Se calhar era mesmo assim que era suposto acontecer…
De uma coisa tenho a certeza: em 2018 voltarei a estar na arena às 00:00 para o arranque do UTSM 😉



4 comentários:

  1. Mucho ánimo Paulo, para el 2018 ya tienes otro motivo más de ilusión, superar un reto que ahora sí sabes lo difícil que es. Yo abandoné en el km 77 en 2015, completé la prueba de 60 kms en 2016 y este año me saqué la espina concluyendo los 100 kms. Força

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Hola Jose
      Sí, en 2018 estaré allí de nuevo para intentar los 100k.
      Gracias por el ánimo
      Abrazo

      Eliminar
  2. Porra, virar o barco logo assim ao inicio deve ser muito duro :\ Nunca me aconteceu, mas provavelmente teria desistido logo ao primeiro. Um abraço e força nisso, há muitas provas!

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Passou-me pela cabeça desistir logo ali em Alegrete, mas teimoso que sou decidi continuar até onde desse. Mas era claramente um dia Não! À saída de Alegrete o frontal fica sem bateria, quando supostamente deveria aguentar até ao amanhecer...
      Enfim, são experiências que ficam e que servem para aprender. Pro ano há mais UTSM!!
      Abraço

      Eliminar