quarta-feira, 20 de dezembro de 2017

Trail Abrantes 100


Sexta-feira, meio da manhã; acordei com as vias respiratórias completamente entupidas, cheio de dores de cabeça e a vomitar...  Andei a semana toda a escapar à vaga de constipações que andava lá por casa, e no dia em que tinha de estar mesmo bem, levei com ela toda em cima. Mal me conseguia mexer, mal me aguentava em pé, comer nem pensar... 12h antes do início da prova o meu pensamento era não ir. A Ana Bela envia uma mensagem ao Paulo, com quem eu tinha tudo combinado para ir, a avisar que não estava bem e a pensar em não ir, mas ficamos de dizer alguma coisa mais tarde. Entretanto, tanto ela como os miúdos, principalmente o Tomás, vão dando força e incentivando para animar e ir. Vou tomar um banho, visto-me e aos poucos começo-me a sentir melhor, e mando esta mensagem ao Paulo:
A muito custo consegui comer um bocado de arroz e um pedaço pequeno de carne, fui à farmácia comprar Antigripine, coloquei as coisas no carro e arranquei em direcção a casa do Paulo. O espírito já era outro neste momento
A viagem até Azeitão foi rápida e calma, coloquei tudo no carro do Paulo e arrancámos: os Paulos e as Anas, as dele que a minha ficou por cá :)

Viagem até Abrantes nas calmas e na conversa, com muito nevoeiro e uma paragem em Ponte de Sor para jantar bem. 9 e tal da noite chegámos a Abrantes, fomos levantar dorsais e assistir à tertúlia; conversa interessante durante pouco mais de hora e meia.



De seguida aproveitar as boas instalações disponíveis para equipar abrigado do frio e da chuva molha tolos que caía, e por fim concentrar para a grande jornada que teria pela frente.


Bem dispostos, nada nos assustava!!







Concentrado enquanto ouvia o briefing, momentos antes da partida
Pela 01h da manhã é dada a partida.


Caía um orvalho, nem sei se chegava a poder ser considerado molha tolos! A temperatura, contrariamente ao que temia, estava bestial para correr. 
Arrancámos nas calmas.
O Paulo vinha de lesão e tinha poucos treinos para esta prova, pelo que o combinado era irmos sempre juntos, mas ele comandava; se se sentisse bem corríamos e se sentisse algum tipo de dor/cansaço abrandávamos; não forçar a subir e correr no plano e descidas. Plano simples portanto!!

E a verdade é que fomos indo sem grande dificuldade sempre num ritmo confortável para os dois em que nos permitia ir a conversar. Rapidamente passámos pelo 1º abastecimento ao km9 mas não parámos e seguimos directos para o abastecimento aos 16k. Por esta altura já nos tínhamos apercebido que a maior dificuldade que iríamos ter era o nevoeiro nalgumas zonas: com o foco do frontal chegávamos a ver pouco mais de um par de metros por vezes. Nalguns locais, principalmente bifurcações (e esta acho que é a única crítica que faço à organização) as marcações estavam fracas, com poucos refletores e as fitas brancas não se viam.
Chegámos ao 2º abastecimento na aldeia de Sentieras, e a animação no local do abastecimento era brutal. Brutal era também a mesa que ali tínhamos à nossa disposição, cheia de comida, e a simpatia das muitas pessoas que ali estavam que prontamente se ofereceram para nos ajudar e tirar fotos connosco!!! Depois de reabastecidos lá seguimos, e à saída do abastecimento, tal como nos seguintes, era brutal o choque térmico que levávamos: à saída ficávamos gelados levando alguns minutos até recuperar a temperatura.

O próximo abastecimento era em Casais Revelhos ao km25 e lá fomos nós sempre a manter o plano. Uma vez mais ao chegar ao abastecimento, a animação era enorme, e a comida nas mesas também!! Tratámos de abastecer e comer com calma, e arrancámos para mais um segmento, este de apenas 6km até Casal das Mansas. Neste segmento senti algumas dificuldades: não me apetecia correr, só queria poder encostar-me e dormir!! Ia cheio de sono e o Paulo só perguntava se me podia bater para ver se acordava!!! Lá me fui arrastando até ao abastecimento e aqui chegado perguntei à simpática senhora que lá estava se havia café. A resposta foi negativa, já tinha acabado, mas rapidamente fizeram mais e me deu uma caneca de café, acabadinho de fazer, nham nham :P O Paulo estava a apressar-me, mas eu só queria beber o meu cafezinho!! Lá lhe fiz a vontade e me despachei o possível, e seguimos para as Mouriscas, dali a 6k apenas. 

Entre abastecimentos não há muito que contar, o percurso era agradável, pouco técnico e muito corrível, e a noite estava bestial para correr, ninguém diria que estávamos em Dezembro!!

Quando chegámos ao abastecimento estava cheio de fome. Sentei-me e enchi-me de batata frita e 2 sandes de presunto. Fiquei satisfeito, abasteci os flasks e arrancámos. Este seria o último abastecimento de noite, o próximo era aos 50k na Concavada, a base de vida. 
E chegámos lá, contrariamente a todas as previsões do Paulo que falava em estarmos lá entre as 9 e as 12h, eram cerca das 8.10 da manhã!! Estávamos bem, muito bem. Eu ia a sentir-me espectacular, já tinha falado para casa com a Bela e os miúdos, estava tudo a correr às mil maravilhas que até parecia mentira!! 
Neste abastecimento tínhamos planeado fazer uma paragem prolongada, e arrancar por volta das 9 da manhã. Aproveitámos para mudar de roupa e comer. Comi bastante mesmo, cheguei aqui esfomeado e aproveitei para comer descansado e recuperar energias. Aqui tivemos também pela 1ª vez a companhia das Anas do Paulo, que nos ajudaram a trazer comida, a encher flasks, a relembrar-me para tomar o antigripine... um sem fim de coisas mas que numa prova destas por mais pequenina que seja a ajuda faz imensa diferença.

Saímos retemperados e cheios de confiança. Metade estava feito, a metade que considerávamos mais difícil por ser de noite, por causa do nevoeiro, do sono, erc.

Com o passar dos km e a perspectiva de fazer um bom tempo, nesta altura apontávamos para algo à volta das 15h, a confiança ia em altas e seguíamos bastante animados. 
Rapidamente chegámos ao abastecimento seguinte, aos 58k na Central do Pego, comemos qualquer coisa e seguimos. O próximo era aos 67e lá chegados contámos novamente com a ajuda das Anas, e só tivemos de comer e descansar. Uma das pessoas que lá estava também nos diz que estamos muito bem classificados, pelo 30º lugar, e saímos cheios de ânimo para mais um segmento de 8k, até às Arreciadas.

Ao chegar ao abastecimento, foto da Ana Ribeiro Alves
Cheguei a este abastecimento novamente cheio de fome!! Comi novamente bastante, quando não havia sandes de presunto as senhoras iam fazer mais!! 
Saímos novamente cheios de confiança e com um até já, pois o próximo abastecimento era dali a apenas 5k.

E foi depois deste abastecimento dos 80k, não sei ao certo quanto km depois, que deixei de conseguir correr. A dor já vinha a aparecer há alguns km, mas com 80k nas pernas é normal ter dores!! Pensei que fossem cãimbras, e fui seguindo, mas as dificuldades para correr foram aumentando. 
E aqui toda a prova foi por água abaixo.... As perspectivas de lutar por ganhar mais alguns lugares na classificação, fazer um bom tempo, terminaram por aqui. Ainda disse ao Paulo para ele seguir, eu não ia desistir mas já não conseguia correr... Ele não me abandonou, e assim fomos em modo caminhada até ao Tramagal, aos 93k.

À chegada ao Tramagal, foto da Ana Ribeiro Alves

Chegada ao Tramagal, adoro esta foto!
Neste abastecimento ainda tinha alguma esperança que fossem câimbras o que sentia, e tomei uns comprimidos de magnésio e comi banana, mas nunca chegou a fazer efeito, o mal era outro....
E lá seguimos resignados, eu a lutar contra as dores e o Paulo sem nunca me abandonar. 
Estes últimos km, não até aos 100 como "prometido" mas 104.5 que marcou no meu relógio (estreei aqui o meu novo Suunto Spartan Ultra, espectacular!!), foram uma guerra enorme, mas já tinha decidido que iria terminar custasse o que custasse...
O percurso junto ao rio até era capaz de ser agradável, mas eu não tinha vontade nenhuma de olhar pro lado... só queria chegar à ponte para atravessar para a outra margem, mas a porra da ponte nunca mais chegava... Quando por fim chegou, já de noite, faltava "só" mais um bocadinho, que era voltar para trás um par de km num trilho junto ao rio, mas com bastante pedra solta e alguns declives. Louvo a paciência que o Paulo aqui teve comigo, obrigado amigo...
Por fim, apanhamos a última rampa, e chegados lá acima o Paulo avança e diz estas palavras que não esqueço: "Este momento é teu, lutaste para o conseguir, espero por ti ali na meta. Não chores!!".
Mas chorei. Liguei para casa a dizer que estava feito, que estava a chegar ao estádio; desliguei o telefone, olhei para o céu e ofereci esta prova a Ela que nunca me abandona, a minha Mãe. Chorei, gritei, descarreguei tudo enquanto percorria os metros iniciais no tartan da pista. 
Na meta já via o Paulo, as Anas e alguns elementos do staff a puxar por mim e a bater palmas. Sem conseguir, tentei fazer alguma coisa parecida com corrida nos últimos metros, e terminar a prova com alguma dignidade!!









Não tenho ainda palavras para agradecer ao Paulo, à Ana e à Ana por tudo... Toda a atenção, a ajuda, o carinho e paciência que tiveram para comigo, sem vocês acho que não tinha terminado a prova. Mais uma vez, obrigado :)

Quanto à prova/organização, já mencionei acima a questão das marcações que, nomeadamente nalgumas bifurcações deveria ser reforçada. Quanto ao resto, e enquanto pude desfrutar, adorei o percurso, estava a ser a prova perfeita. E os abastecimentos.... bem, estes abastecimentos foram simplesmente os melhores que já apanhei. E a simpatia dos voluntários, sempre prontos a ajudar, sempre a apoiar, TOP TOP

Um ponto negativo, para mim: a medalha finisher não gostei. Admiro o atleta que está retratado na medalha, mas um bocado de plástico com uma fotografia de um atleta penso que não seja a melhor opção. Porque não com o castelo de Abrantes???

Como disse, gostei da prova, e conto voltar para melhorar este tempo ;)

2 comentários:

  1. Uma chegada digna, sem dúvida :) Muitos parabéns, Paulo. OS 3 dígitos são teus! Um abraço

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    1. Um bocadinho digna!!
      Falhei a 1ª tentativa mas desta consegui os 3 dígitos!
      Abraço e boas festas ;)

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